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TOLÉ PARTIU SEM AVISO-PRÉVIOTOLÉ PARTIU SEM AVISO-PRÉVIO

TOLÉ PARTIU SEM AVISO-PRÉVIOTOLÉ PARTIU SEM AVISO-PRÉVIO

Por Walmir Rosário*
Domingo em Canavieiras, dia de pleno sol, próprio para a praia, a cerveja com
os amigos, as partidas de futebol, e o mais importante: as discussões entre os
torcedores. Meu velho amigo Antônio Amorim Tolentino, Tolé, para todos, não
participou de nada disso, preferiu viajar e tomou o caminho sem avisar a
ninguém, nem aos amigos mais chegados e familiares. Simplesmente partiu.
Eu fui surpreendido pelo amigo em comum Luiz Sena, que aos prantos me
pedia para confirmar ser verdade o passamento de Tolé. Eu ainda nem sabia
deste triste acontecimento. Tolé era uma espécie de tutor de Sena, que chegou
ainda rapazinho no Banco do Brasil em Canavieiras.
Pelo visto, deve ter sido interpelado por São Pedro ao bater à porta do Céu,
para prestar contas de sua passagem por esse mundo. E foi preparado,
vestindo uma vistosa camisa do Flamengo, seu time de coração. Desconheço se
São Pedro gosta de futebol, mas Tolé deve ter dito que empreendeu a viagem
para assistir de cima a disputa da Copa Brasil, com uma visão privilegiada.
Por certo, após os santos questionamentos, saberá convencer o chaveiro do
Céu. Apesar de não ser um católico praticante e se considerar amigo chegado
de São Boaventura, pois morava ao lado da Igreja, sabia como ninguém o que
se passava no templo, sem precisar subir os degraus da matriz. Ouvia tudo pelo
rádio ou por meio dos amigos.
Em sua defesa deve constar nos livros de São Pedro suas ações pró São
Boaventura, desde as discussões sobre o verdadeiro dia da homenagem ao
Santo-Doutor da Igreja Católica passando pelas comemorações profanas. Deve
estar lá anotado, quando em plena pandemia, Matriz fechada, ele se
encarregou, junto aos vizinhos, de promover a lavagem das escadarias,
portando baldes com água, vassouras e água de cheiro.
Tolé era (acredito que ainda é) uma daquelas figuras que nunca se esquece.
Quando ainda fazia parte da alta boemia canavieirense, se tornou um colega de
farra imprescindível em qualquer festejo. Um dos fundadores da Confraria d’O
Berimbau, lavrava as atas semanais e ainda se atinha ao caixa nos devaneios
de Neném de Argemiro, para não permitir que, por pressa ou esquecimento,
alguém saísse sem proceder ao devido pagamento.
Membro da Galeota Ouro, Tolé era figura de proa na organização do maior
evento turístico etílico e gastronômico de Canavieiras. Uma esculhambação
devidamente organizada. Acredito que lá em cima já deve ter se reunido com
os amigos Tyrone Perrucho, Neném de Argemiro, e muitos outros que partiram
antes dele. Acredito que já planejam coisas do tipo lá em cima, se é que
permitido.
Mas o zeloso funcionário da Caixa Econômica Federal amava sua Canavieiras,
tanto assim que trocou de emprego, ingressando no Banco do Brasil para voltar

à sua terra. Bancário conceituado, também foi secretário municipal em
Camacan e Canavieiras, esta por diversas vezes. Em todo esse tempo sempre
foi visto como uma reserva moral (como todos deveriam ser) no serviço
público.
Tolé também era dono de uma “pena” afiada. Foi um dos fundadores do jornal
Tabu, ao lado de Tyrone Perrucho, Durval França Filho, Almir Nonato,
Raymundo José dos Santos e Lindinberg Hermes. Sabia escrever um texto
“apimentado”, porém devidamente terno e educado. Era pródigo em panfletos
eleitorais, elaborados com o fino humor e sarcasmo.
Mas, com o tempo, Tolé mudou, para o desespero dos seus colegas. De uma
hora pra outra passou a autointitular-se abstêmio. Mas não seria um abstêmio
qualquer, moderado, e declarou guerra às bebidas alcoólicas. Essa sua decisão
causou um terremoto entre os amigos que passaram a considerá-lo um vira-
casaca, traidor da causa boêmia. Não arredou o pé e manteve sua decisão pra
sempre.
Mas neste sábado (26) conversávamos – eu, Raimundo Tedesco e Alberto Fiscal
– sobre as peripécias de Tolé, a exemplo da viagem que fez com Tyrone a
Salvador sob o pretexto de comprar um carro. Arrebanharam mais dois colegas
e partiram para a capital. Carro pronto, partiram numa viagem que levou quase
15 dias no percurso de volta até Canavieiras.
De outra feita, Tolé se organizou com os colegas do Banco do Brasil para
participarem da inauguração do Estádio Luiz Viana Filho (hoje Fernando
Gomes), em Itabuna. Na caravana, o dito cujo, Raimundo Tedesco, Fred e
Jovaldo. Ao raiar do dia embarcaram e fizeram a primeira parada em Panelinha,
para o café da manhã, melhor seria cerveja da manhã.
E eles tocam o “barco” até Camacan, a segunda para, sendo recebidos por pelo
colega do BB, Jolinson Rosário. No início da tarde saem para Itabuna, que seria
o destino. Mas o colega Jovaldo, pernambucano do agreste, queria conhecer
Ilhéus, resolveram partir para dar uma voltinha na vizinha cidade e retornarem
para o jogo.
Deram uma volta pela cidade até descobrirem um bar do jeito deles e por lá
ficaram até o cair da noite. Resultado, o turismo esportivo ficou pra nova
oportunidade e Tolé somente foi conhecer o estádio de Itabuna 12 anos depois.
Quem lê essas linhas não tem a ideia do Tolé pai de família extremado, amigos
à mancheia e que deixa saudades.
Pelo que eu soube – confidencialmente –, assim que chegou bateu à porta do
Céu, prontamente aberta por São Pedro, que fez mesuras ao convidá-lo:
– Entra, Tolé, seus amigos já estão lhe esperando!

*Radialista, jornalista e advogado.

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