PRAÇA DOS RATOS, SÓ PARA QUEM TEM AS MANHAS-Por Walmir Rosário*
Peças artísticas e pedras preciosas (acervo: site da
Prefeitura de Campo Formoso)
Em várias cidades que conheço – e são mais de uma centena – existe um local
denominado de ilha ou praça dos Ratos. Geralmente é povoada por comerciantes
especializados em produtos e serviços de vendas e trocas. Em sua maioria abrigam
corretores de veículos, mas podem ser de artigos variados, até mesmo de produtos de
origem duvidosa, mas a que neste momento me refiro é de pedras preciosas, ou não.
E a chamada praça dos Ratos, em Campo Formoso, famosa por seus vendedores de
pedras preciosas, com oportunidade de lhe tornar milionário num piscar de olhos, e para
tanto basta ajustar o preço. Como sempre, assim que aborda um possível cliente – ou um
simples incauto, o pedrista, como é chamado, tira do bolso ou de uma mochila um
saquinho repleto de pedras, na maioria esmeraldas, embora, também, poucos diamantes.
Sempre vou a Campo Formoso visitar parentes e amigos. No início deste mês de fevereiro,
fui comemorar os 93 anos de minha mãe, que reside com minha irmã Iracy. Na
oportunidade em que estive na praça os pedristas já tinha saído, pois o relógio já marcava
depois do meio-dia, horário mais apropriado às comemorações etílicas, exceto o amigo
Toncar (Antônio Carlos), que bate sino para o início dos trabalhos às 11 horas das sextas-
feiras, com muita propriedade para que goza da sonhada aposentadoria.
Nesta viagem não pude ver as novidades das pedras preciosas cujos vendedores teimam
em me tornar milionário. Confesso que nunca comprei uma pedra sequer, mas faço
questão de dar uma passada na praça dos Ratos (praças Herculano Menezes e Luiz
Viana), e como não quero nada, vou olhando os produtos expostos em mesinhas. Ouço
muito e converso pouco, com receio de falar besteira, dado o nenhum conhecimento sobre
o tema.
E os “franciscanos” pedristas a mim se apresentam como garimpeiros que vieram à cidade
comercializar a produção de seus cortes e investir mais na mineração. E num gesto
próprio dos gentis cavalheiros, revelam ter gostado muito de minha atenção e educação,
daí estarem dispostos a me vender a produção da semana por míseros R$ 5 mil.
– Se vosmicê der uma lapidada nestas pedras vai vendê-las por 20 vezes mais –, promete.
Enquanto aguarda a minha contraoferta, se aproxima outro pedrista e, sem mais
delongas, interrompe nossa conversa, e pergunta ao colega se já teria tomado a decisão
sobre a oferta que lhe teria feito, coincidentemente, R$ 5 mil, o mesmo preço a mim
ofertado. E ele responde que teria me oferecido o mesmo produto e que aguardasse o
final da negociação.
– Nesse caso, não quero atrapalhar a negociação e pode vender para o distinto moço pelo
mesmo preço –, que ele não se incomodaria.
Olho para os dois e meio avexado respondo não estar interessado no produto, por ser um
completo “analfabeto” no assunto e que estaria ali apenas para ver a beleza das
esmeraldas. O garimpeiro vendedor me agradece e faz de conta que estaria disposto a
fechar o negócio entre eles. Pelo que notei, apenas um gesto de faz de contas para
imprimir credibilidade ao negócio. Fútil ilusão.
Em algumas viagens a Campo Formoso já me dediquei à curiosidade de repórter para
visitar garimpos, recusar convites para descer mais de 100 metros terra abaixo, aceito de
pronto pelo meu companheiro de viagem, o cirurgião-dentista Guilherme Lamounier. Como
acho um assunto palpitante, gosto de prosear com garimpeiros sobre os acertos e
desacertos dos que ficaram milionários e os perderam tudo nas farras.
Bráulio me garantiu que já viu de tudo no garimpo de Campo Formoso e redondezas. E
me contou histórias do arco-da-velha, acontecidas com pessoas que deram sorte na vida,
nas lavras ou na corretagem das esmeraldas. Desses, dois personagens eram irmãos e
diziam que possuíam tantas pedras de esmeralda que nem Deus conseguiam acabar.
Resultado, de tantas ações perdulárias cometidas na vida, que morreram à míngua, como
se diz sobre os que perdem todas as riquezas antes de deixar esse mundo.
Um outro, que bamburrou numa mina de esmeralda, aos domingos, ia à feira do Socotó
(distrito de Campo Formoso), e fechava os três bares existentes, distribuindo bebidas à
população em geral. A cada fim de semana mais gente aparecia para beber de graça, com
as contas aumentando de forma astronômicas. Abandonou a família e quando adoeceu foi
socorrido por uns poucos parentes até que a morte o levou, desprevenido até do dinheiro
para comprar o caixão funerário.
Contudo, esses exemplos ruins não podem adjetivar a extração de pedras preciosas como
uma atividade amaldiçoada. Muitos que fizeram fortunas nesses garimpos de esmeraldas e
diamantes são por demais conhecidos por levarem uma vida simples, combinando a sorte
na mineração com a austeridade. Os incautos que se cuidem, pois os expertos estão por
todos os lados prometendo riquezas. Quando a esmola é grande demais até os santos
desconfiam.
Enfim, a extração de pedras preciosas é uma das pujantes matrizes econômicas de Campo
Formoso, mas aos que como eu não conhecem a atividade, comprem as pedras e as artes
que mais lhe agradem, e estejam bem atentos às histórias.
*Radialista, jornalista e advogado