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O FAIR PLAY E A ÉTICA NA POLÍTICA BRASILEIRA Por Walmir Rosário

O FAIR PLAY E A ÉTICA NA POLÍTICA BRASILEIRA  Por Walmir Rosário

Para acalmar os ânimos mais exaltados, de logo deixo evidenciado que não vou fulanizar
qualquer um dos eleitos ou derrotados nas últimas eleições por esse Brasil afora. O que
pretendo é apenas e tão somente, pelo que consigo vislumbrar, é demonstrar que o antigo
comportamento dos eleitores foi transferido para os políticos. Se antes as pelejas entre os
políticos se davam apenas nos discursos, nos microfones, agora vão às vias de fato.

E suas excelências não economizavam os empolados adjetivos encarregados de
desacreditar os feitos políticos do colega parlamentar. Fora disso, eram unha e carne,
como se diz, no tratamento no cafezinho, no recôndito dos gabinetes, ou nos famosos
restaurantes, locais onde se decidiam mais que o plenário. É que havia o chamado espírito
esportivo, o jogo limpo, ou o fair play, como queria o ilustre Barão de Coubertin.

Lembro-me bem de certos políticos que eram conhecidos pela sua violência verborrágica,
capaz de inebriar seus cabos eleitorais e seguidores, quando das promessas de fazer e
acontecer para derrotar, desmoralizar o adversário. Claro que do outro lado a massa ficava
enfurecida e volta e meia quando se encontravam numa acirrada campanha eleitoral o
resultado era a contagem de feridos nos hospitais e farmácias.

Após 31 de março de 1964, os políticos se reuniram em apenas dois partidos: a Aliança
Renovadora Nacional (Arena) e Movimento Democrático Brasileiro (MDB), e essa difícil
acomodação era feita em sublegendas. Se a convivência aberta ao público não era boa
entre os membros das duas agremiações, internamente a convivência, às vezes, nunca foi
assim tão salutar. Odiavam-se e toleravam-se como mandam as regras sociais.

Nessa época um fato inusitado foi registrado na Câmara de Itabuna, em que um único –
se não me engano – vereador emedebista foi eleito presidente do legislativo, embora a
maioria esmagadora era filiada à Arena. Os parlamentares municipais arenistas
distribuídos nas sublegendas 1, 2 e 3 não conseguiram separar suas divergências
partidárias e preferiram eleger Raimundo Lima, um comunista abrigado no MDB.

Não posso esquecer a disputa nos comícios, principalmente os frequentados por Fernando
Gomes, candidato da oposição, emedebista oriundo do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB)
e os arenistas vindos da União Democrática Nacional (UDN), do Partido Social Democrático
(PSD), dentre outros. Em cima dos palanques eram promessas de brigas e mortes caso se
encontrassem. Cada qual mais valente que outro.

Os discursos encantavam a multidão, principalmente por desafiar os poderosos, os
militares da revolução de 64. E a plateia vibrava, se sentia representada, por um salvador
Davi contra o perverso gigante Golas. No outro palanque, as promessas eram basicamente
a mesma, e os seguidores de cada lado não viam a hora do juízo final, quando seriam
cumpridas as promessas solenemente feitas nos palanques.

Pois bem, em Itabuna a oposição se muda de vez para a prefeitura com a eleição de José
Oduque, com Fernando Gomes tomando assento na Secretaria da Administração, à época
uma das mais poderosas. Destemido, Fernando Gomes se elege prefeito e a política fica,

ainda mais acirrada. Eram os arenistas no Governo Federal e da Bahia e os emedebistas
em Itabuna, sempre reclamando do tratamento recebido a pão e água.

Com isso, a cada obra feita, a cada carro comprado, junto com a logomarca da prefeitura
vinha a inscrição em letras maiores: “Adquirido com recursos próprios”. E era preciso
industrializar Itabuna a todo o custo. E nos jantares na casa Calixtinho Midlej se reuniam
Antônio Carlos Magalhães e Fernando Gomes – políticos considerados impetuosos – para
tratar dos interesses de Itabuna entre copos de whisky, taças de vinho e pratos de pitus.

No seu jeitão em se fazer parecer grosseiro para ganhar a confiança e o voto do eleitor,
Fernando Gomes, àquela época dizia com muita propriedade: “Não tenho inimigos na
política, só adversários”. Na campanha pela criação do Estado de Santa Cruz, Fernando
Gomes enfrentou toda a máquina do Estado da Bahia, liderada por Antônio Carlos
Magalhães, num massacre sem precedentes.

Pouco tempo depois, o Toninho Malvadeza se transforma em Toninho Ternura e Fernando
Gomes era o convidado pra lá de especial no palanque de ACM. As farpas trocadas foram
esquecidas com uma rapidez impressionante pelos seguidores dos dois políticos, que
agora trocavam juras de amor eterno e muitos votos nas urnas. E o receio das fragorosas
derrotas se transformaram em expressivas vitórias.

A partir desse expressivo acordo, as obras chegavam a Itabuna com mais frequência e
nunca mais foi vista a expressão adquirido ou construído com recursos próprios nas placas
dos feitos e veículos municipais. Já com assento garantido nas hostes carlistas, Fernando
Gomes continuou conversando com todos os segmentos políticos, até mesmo com os
ferrenhos adversários.

Fernando Gomes também foi um adversário contumaz do Partido dos Trabalhadores (PT).
Quando perdeu a eleição para Geraldo Simões, no dia seguinte em entrevista de rádio
avisou aos eleitos que preparassem a equipe de transição (a primeira de Itabuna). E para
desgosto dos petistas itabunenses, fez acordos com os governadores Jaques Wagner e Rui
Costa, dos quais passou a ser “amicíssimo desde criancinha”.
Como ele bem dizia: Não tenho inimigos, mas adversários políticos.

Radialista, jornalista e advogado

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